14 de março de 2013


A menina de coxas desproporcionais
e espinhas recém-curadas não sabe,
mas está sendo observada.


Seus olhos presos ao chão,
procurando sabe-se lá o quê,
os cabelos deliciosamente desgrenhados,
ela nem imagina, nem quer saber,
que está sendo observada,
porque se acha feia demais
pra que isso aconteça.

Os feios são belos
pois deixam suas afetações
em casa.
Sabe aquela vontade de ser visto,
notado, amado, invejado?
Pois bem, os feios deixam essas coisas
em casa.

Então eles, os feios,
enfiam suas caras injustamente desprezadas
entre cabelos mal cuidados,
travesseiros mal amados
e noites mal dormidas,
pois o peso da sociedade dita bela
e o bafo da pose dos ditos lindos,
invadem o quarto dos feios com tanta força
que fica muito difícil dormir
com a barulheira
desses ditos
belos. 

Os belos são barulhentos,
pavões gritantes de umbigos enormes,
“Vejam-me!”,
“Admirem-me!”,
“Olhem-me fazendo pose no Instagram!”;
as penas no chão acusam:
aqui esteve o belo.

Louvemos a beleza dos feios, dos imperfeitos,
aqueles que se levantam da cama e, sem artificialismos,
metem a cara na rua e pregam os olhos no chão.

Olhemos os feios.

E a menina de gestos oprimidos
do começo do poema,
aquela toda envergonhada,
meio que se punindo por ser quem é,
lembra dela?

Foi-se embora sem saber
que estava sendo admirada.


Os feios são belos

(Michel Consolação)



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