“Suponhamos
que eu seja uma criatura forte, o que não é verdade. Suponhamos que ao
tomar uma resolução eu a mantenha, o que não é verdade. Suponhamos que
eu escreva um dia alguma coisa que desnude um pouco a alma humana, o que
não é verdade. Suponhamos que eu tenha sempre o rosto sério que
vislumbro de repente no espelho ao lavar as mãos, o que não é verdade.
Suponhamos que as pessoas que eu amo sejam felizes, o que não é verdade.
Suponhamos que eu tenha menos defeitos graves do que tenho, o que não é
verdade. Suponhamos que baste uma flor bonita para me deixar iluminada,
o que não é verdade. Suponhamos que eu esteja sorrindo logo hoje que
não é dia de eu sorrir, o que não é verdade. Suponhamos que entre os
meus defeitos haja muitas qualidades, o que não é verdade. Suponhamos
que eu nunca minta, o que não é verdade. Suponhamos que um dia eu possa
ser outra pessoa e mude de modo de ser, o que não é verdade.
Clarice Lispector - Supondo o errado!
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